“Abaporu” (1928), Tarsila do Amaral


Por Sidney Falcão

O que a princípio era apenas um presente de aniversário, tornou-se não apenas o ponto de partida para o surgimento de um importante movimento artístico modernista, mas também consolidando-se como uma das obras mais emblemáticas da História da Arte brasileira. Trata-se da tela “Abaporu”, de Tarsila do Amaral. 

Proveniente da fase artística conhecida como Pau Brasil, caracterizada pela utilização das "cores caipiras" e formas estilizadas de influência cubista, Tarsila do Amaral (1886-1973) retratava a ambientação do interior do Brasil com suas frutas tropicais, caboclos e vilarejos. Em 1928, concebeu o que viria a ser sua obra-prima, talvez sem antever a revolução que sua peculiar pintura desencadearia. 

Essa história singular teve início quando a obra foi presenteada ao escritor Oswald de Andrade (1890-1954), na ocasião, marido de Tarsila. A figura humana estilizada, com um pé desproporcional, um braço avantajado e outro diminuto, além de uma cabeça ínfima, causou espanto e fascínio em Oswald, motivando-o a compartilhar a descoberta com o escritor Raul Bopp (1898-1984). 

Esse momento de contemplação e quase "adoração" à tela inspirou uma profusão de ideias e debates criativos. Oswald enxergou na figura disforme a representação de um antropófago, termo que logo foi incorporado ao título da obra: Abaporu, que significa "homem que come gente" em tupi-guarani: abá (homem), poru (gente), ú (comer) - "homem que come gente". 

A reação de Oswald impulsionou a redação do "Manifesto Antropofágico", publicado no mesmo naquele mesmo ano de 1928 na Revista de Antropofagia, propondo a assimilação das vanguardas artísticas europeias pelos artistas brasileiros para a criação de uma arte moderna nacional, mantendo-se fiéis às suas raízes. Esta proposta, associada à obra "Abaporu", marcou o início de um novo capítulo na arte moderna brasileira. 

Em uma entrevista concedida à revista Veja em 1972, um ano antes de seu falecimento, Tarsila atribuiu a ideia do movimento antropofágico a Raul Bopp, embora tenha sido vinculada a Oswald posteriormente. Este movimento não apenas sintonizou o Brasil com as vanguardas artísticas, mas também resgatou e reafirmou suas origens. 

Em 1995, Abaporu foi adquirida em leilão pelo colecionador argentino Eduardo Constantini, pelo valor recorde de US$ 1,5 milhão, tornando-se a obra brasileira mais cara vendida em leilão. Hoje, essa tela emblemática, que tanto contribuiu para associar o modernismo à identidade brasileira, encontra-se no Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires (MALBA). 

Ficha técnica

Título: Abaporu

Artista: Tarsila do Amaral

Ano: 1928

Técnica: óleo sobre tela

Dimensões: 85 X 73 cm

Localização: Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires, Argentina

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