"Retirantes" (1944), Portinari



Por Sidney Falcão 

Quando Cândido Portinari (1903-1962) pintou "Retirantes", em 1944, o mundo passava por grandes transformações, tanto políticas como sociais. O mundo vivenciava ainda a 2ª Guerra Mundial, que já chegava na sua reta final e que depois de terminada, no ano seguinte, culminaria na bipolarização político-econômica entre Estados Unidos e União Soviética, dividindo o planeta em dois blocos econômicos: o capitalista e o socialista.

No Brasil, ainda no governo de Getúlio Vargas, que também chegaria à sua reta final, as transformações também ocorriam. O país aos poucos deixava de ser rural para se tornar mais urbano, graças ao desenvolvimento econômico e social trazido pela gestão de Vargas ao longo de quase 15 anos no poder. A industrialização que avançava no Sul-Sudeste do país, principalmente em São Paulo, atraía mão-de-obra barata de outras partes do Brasil. O Nordeste, que ainda estava distante desse desenvolvimento, era o grande "fornecedor" dessa mão-de-obra, que fungindo da seca implacável do sertão, buscava uma vida melhor no "Sul Maravilha".

Influenciado pela pintura cubista e politizada de Picasso, e social do Muralismo Mexicano, Portinari já vinha desenvolvendo em seus quadros, uma pintura engajada, voltada para as questões sociais do Brasil, como "O Mestiço" (1934) "O Lavrador de Café" (1934) e "Café" (1935). Nesse campo social, a literatura brasileira estava bem representada com nomes como Jorge Amado e Graciliano Ramos, este último, autor do aclamado "Vidas Secas", um livro que bem poderia considerar-se um "parente" de "Retirantes" de Portinari.

Naquele momento, para Portinari, não bastava ao artista, retratar uma temática modernista brasileira, uma herança da geração da Semana de 1922. Para Portinari, era importante desenvolver também uma arte não só moderna, mas também envolvida com os problemas sociais, uma arte que denunciasse as nossas mazelas.

Partindo desse princípio, Portinari executou em 1944, uma das mais expressivas obras da arte brasileira do século XX: "Retirantes". A tela retrata com grande força expressiva, uma família de retirantes nordestinos, que assim como tantas outras famílias nordestinas, deixavam o desolado sertão nordestino para buscar um futuro melhor no Sudeste, que naquele momento, estava em franco desenvolvimento. Essa migração perduraria por quase 6 décadas, só diminuindo neste começo de século XXI.

O impacto e o sucesso que esta tela teve, se devem à carga expressiva empregada por Portinari nas figuras retratadas, numa combinação estética de Cubismo e Expressionismo. Corpos esquálidos e maltrapilhos, olhar de desesperança somados ao predomínio de tons cinzentos e escuros, reforçam a dramaticidade que o quadro expressa. Os urubus e um corpo celeste sem brilho, que mal se sabe se é sol ou lua, completam o aspecto dramático e sombrio da obra.

O engajamento social de Portinari, ultrapassou a fronteira das artes. Filiado ao Partido Comunista Brasilieiro (PCB ), o pintor paulista candidatou-se a deputado em 1945 e a senador em 1947, mas em ambas tentativas, não se elegeu.

Ficha técnica
Título: "Retirantes"
Artista: Cândido Portinari
Ano: 1944
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 190 X 180 cm
Localização: Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, São Paulo, Brasil


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